LEI DOS EXCESSOS: imperativo capitalista e sintoma social

LEI DOS EXCESSOS: imperativo capitalista e sintoma social

No final do século XIX alguns casos movimentaram a medicina da época. Casos que não tinham representações orgânicas, mas que tinham sintomas físicos, como por exemplo, cegueira, paralisia, tosses, espasmos ou surdez. Como não apresentavam lesões orgânicas, eram percebidos como teatrais ou dissimilações. Por esse fenômeno ser mais recorrente em mulheres deu-se o nome de histeria (do grego hystera que significa útero). No entanto, naquela época, Freud reconheceu verdade nesses casos, percebeu que havia sofrimento psíquico e a partir de seus estudos fundou a Psicanálise.

Quando Freud reconheceu que o sintoma físico manifestava o que já havia começado no psiquismo notou que o sintoma manifestado “apontava para algo fora do lugar”. As histéricas de Freud apontavam para o sintoma social da sociedade vitoriana. As mulheres eram reprimidas, forçadas a obedecer um padrão social, pautado na rigidez do discurso religioso e moral. Desse modo, a partir de seus sintomas, revelavam o mal-estar e os desajustes que a tradição designava às mulheres e os novos lugares que se apresentavam diante delas com as mudanças sociais que surgiam.

Na série Gossip Girl adolescentes ricos exploram as “tentações” que a cidade Nova York oferece.

 

No século XIX homens e mulheres sofriam muito mais com a “lei” do imperativo moral e religioso que reprimiam e impediam as pessoas de satisfazerem seus desejos. No século XXI o antigo discurso perdeu sua influência para um Outro que diz: Compre! Possua! Faça! Ou, como se diz na psicanálise, Goze!

Essa é a Lei dos excessos, não importa se já está satisfeito, mais é sempre bom.

Com a ascensão do capitalismo vemos diariamente na TV, nas revistas ou nas redes sociais um imperativo publicitário demandando de seus telespectadores que desejem o celular de última geração, o corpo ideal, um casamento blindado, a carreira de sucesso, enfim, toda essa indústria do espetáculo promete atender aos nossos anseios e não importa o que já tenha conquistado até aqui, sempre tem como melhorar.

Porque somos seres faltosos estamos sempre em busca de algo que nos satisfaça.

O imperativo capitalista

Esse discurso é totalmente consciente da dimensão subjetiva de cada pessoa e “trabalha” como produtora de sentido, desse modo, uma série de mensagens é embutida no cotidiano exigindo o tempo todo que as pessoas estejam a disposição para usufruir os prazeres do presente, de cultivar o corpo e se entregar a essas fantasias de felicidade em conjunto com o apelo publicitário.

Os problemas desse imperativo produz sujeitos prontos a responder as imagens e objetos que lhes apresentam, ligados a viver o “aqui e agora” e que condena tudo aquilo que lhe é contrário. É o que acontece com os sentimentos de tristeza, desânimos e até mesmo simples manifestações de dor . A angústia de viver é considerada intolerável, como se tivéssemos a obrigação de estar o tempo “de bem com a vida”.

Antonio Quinet no livro Os Outros em Lacan diz que uma “sociedade regida pelo discurso capitalista se nutre pela fabricação da falta de gozo, ela produz sujeitos insatisfeitos que, em sua demanda de consumo, nunca conseguem comprar tudo o que supostamente desejam […] O discurso do capitalista […] ele é segregador. A única via para tratar as diferenças na sociedade científico-capitalista é a segregação determinada pelo mercado: os que têm ou não acesso aos produtos da ciência. é um discurso que não forma propriamente laço social, ele segrega – daí a proliferação dos sem: terra, teto, emprego, comida etc.”

 

O filme O mínimo para viver conta a conturbada história de Ellen que lida com a anorexia

 

Assim, hoje vemos patologias “sem representação”, manifestadas pelo corpo ou em ato, como por exemplo, a autoflagelação, depressão, anorexia, bulimias, vigorexia, hipocondria, consumo de drogas lícitas e ilícitas. O discurso capitalista, por lançar um ideal inalcançável, também produz e reproduz cada vez mais injustiça social e, como se já não bastassem todas essas manifestações corporais e sociais do sofrimento psíquico, as medicações surgem como abreviador da felicidade, logo, a indústria farmacêutica se agrega as ofertas de mercado.

Hoje em dia é comum ouvirmos expressões como: “isso é psicológico!”, “isso é de ordem emocional!” ou “tá assim porque quer”, “isso é falta de surra”. Esses enunciados colaboram com o sentimento de frustração e desvalorizam os sentimentos e afetos humanos e não apontam para uma solução útil. O sintoma social do século XXI expõe que esse modelo social de felicidade constante não é real, além de segregar as diferenças socioeconômicas que o próprio discurso produz. A psicanálise propõe, ao que busca soluções para seu sofrimento, se perceber nesse sintoma contemporâneo e auxiliar o sujeito a se reinventar nas possibilidades de seu horizonte de sentidos.


Caso você esteja enfrentando algum problema, reconhece que seu sofrimento é parecido com o que foi descrito acima e não consegue lidar sozinha (o), procure um(a) psicóloga(o) mais próximo ou entre em contato pelo e-mail ou WhatsApp.

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Anna Carolina Cutrim
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